Comitê dos EUA passa lei contra Moraes, e Casa Branca faz alerta ao Brasil

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Um comitê do Congresso americano aprovou, nesta quarta-feira (25), um projeto de lei que cria sanções contra o ministro Alexandre de Moraes. No Comitê Judiciário, a proposta “No Censors on our Shores Act” (Sem Censores em nosso território) estabelece a deportação e o veto de entrada nos EUA a qualquer estrangeiro que atue contra a liberdade de expressão, violando a Primeira Emenda da Constituição dos EUA.

A lei ainda tem um longo caminho para entrar em vigor, com democratas tentando inserir compromissos por parte dos republicanos a emendar a lei para também punir regimes como o de Vladimir Putin, um aliado de Donald Trump.

O projeto ainda precisa passar pelo plenário da Câmara dos Deputados e pelo Senado, além de ser sancionada depois pela Casa Branca.

Mas a decisão de apresentá-la e encaminhá-la para a plenária da Câmara ocorreu depois de um intenso lobby feito pelo deputado Eduardo Bolsonaro, ao lado de Paulo Figueiredo, neto do ex-ditador brasileiro João Figueiredo (1979-1985) e que foi investigado pela Polícia Federal por envolvimento na tentativa de golpe de Estado no Brasil. Ambos percorreram os gabinetes de deputados republicanos nas últimas semanas pedindo apoio ao texto.

Não por acaso, sua aprovação foi comemorada por bolsonaristas e pela ala mais radical do governo Trump. No governo brasileiro, que tenta atuar com cautela no caso, a votação reflete uma demonstração da disposição de republicanos de intervir nas eleições no Brasil em 2026.

A ofensiva contra o STF e o Brasil começou ainda no ano passado, depois que as instituições nacionais lançaram uma operação para tentar conter a desinformação, investigar planos de um golpe de estado e tentar preservar a democracia.

O tema ganhou força com a suspensão do X do Brasil, alegada pelos americanos como censura em 2024. A plataforma, porém, não havia indicado um representante legal no país e, diante da violação, havia sido barrada. A empresa de Musk cedeu, e voltou a funcionar.

Naquele momento, o gesto de Moraes levou congressistas republicanos e aliados ao bolsonarismo a circular a proposta. Mas acabou sendo adiada.

Agora, a atuação de Moraes voltou ao debate com o caso das empresas de mídia de Trump e a plataforma Rumble. Na semana passada, horas depois de a PGR entrar com uma denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, aliado de Trump, essas companhias abriram um processo nos EUA contra Moraes, alegando censura, omitindo fatos e distorcendo acontecimentos no Brasil.

Moraes suspendeu a Rumble, também por não indicar um representante no Brasil. Um pedido de liminar, porém, foi recusado pela Justiça americana, na terça-feira.

Debate: “censura” no Brasil é “inspiração” para lei

Ao apresentar o projeto, Darell Issa, deputado republicano da Califórnia, admitiu que sua ideia era resultado direto das ações do Brasil e de suposta “censura contra americanos”. “O projeto veio quando Elon Musk se recusou a aceitar as demandas do Brasil e quando X foi suspensa em todo o país”, disse Issa.

“Minha proposta diz: ignore nossas leis em seu país, é seu direito. Se quiser fechar, X, Meta e outras plataformas. Mas não espere vir aos EUA com um visto se você um perpetrador da censura”, disse. Issa comparou a situação do Brasil ao Irã e alertou que não aceitaria que os recursos da Starlink poderiam ser barrados por algo escrito no X.

Emendas contra Trump

Apesar da aprovação, o debate mostrou que a adoção final ainda pode ser um desafio para os republicanos. Jamie Raskin, deputado democrata, lembrou que jornalista do Wall Street Journal foi preso por Vladimir Putin, uma aliado de Donald Trump. “A lei não fará nada para prevenir isso”, alertou. “Se essa lei vai ser aprovada, ela precisa ser construída para lidar com todos os casos. Mas não apenas um país específico”, defendeu.

Raskin, assim, apresentou uma emenda ampliando as sanções para qualquer autoridade que coloque na prisão um americano que escreva algo contra um ditador. A manobra é uma forma de colocar apoiadores de Trump numa situação complicada. Se aprovarem, estão também ampliando as ações contra um aliado do presidente.

Issa, então, se comprometeu a discutir a emenda nos próximos dias, antes de levar o projeto à votação no plenário.

Numa tentativa de mostrar as incoerências, Raskin então questionou como seria a relação com a Alemanha, onde o discurso nazista é proibido, e não nos EUA. “Não afetaria suas ações no exterior”, respondeu Issa.

Issa justificou que não está agindo por Musk e aceitou uma expansão da lei. “Vemos a mesma coisa na Europa e todas são democracias”, disse. Ele acredita que apenas a existência do projeto da lei já teve um “papel importante” no Brasil.

Já a deputada democrata Mary Scanlon alertou que a lei é “impossível” de ser aplicada e apresentou um projeto de emenda. Ela criticou o fato de o projeto ignorar os ataques contra a imprensa por parte de Trump e listou as ações da Casa Branca contra jornalistas profissionais.

Segundo ela, o governo está “protegendo Musk” e “promovendo suas mentiras”. “Se republicanos estão protegendo a liberdade expressão, devem falar do que está ocorrendo”, disse.

Sua emenda pedia que a lei lidasse com os ataques por parte da Casa Branca à imprensa. Mas Issa alertou que isso estava “fora do escopo” do projeto de lei. Questionado se condenaria as ações de Trump, ele apenas indicou que “farias as coisas de forma diferente”.

A emenda que trataria dos ataques de Trump contra a imprensa foi vetada pelos republicanos, que contam com maioria no comitê.

Já Jerrold Nadler, deputado de Nova York, perguntou se havia o devido processo legal para essas pessoas que teriam o visto negado. “Não”, admitiu Issa. “É um buraco negro”, disse. “O visto é um privilégio, não um direito”, afirmou.

Mas a deputada Pramila Jayapal alertou que a parte da deportação exigiria o devido processo legal.

Pressão sobre STF

A votação não é um fato isolado. Nesta semana, o bilionário Elon Musk, um dos principais nomes do governo de Donald Trump, sugeriu nas redes sociais que poderia defender o confisco de bens de Moraes. Numa postagem, ele questionou se o brasileiro conta com propriedades nos EUA.

“Moraes não possui propriedades nos EUA?”, perguntou o empresário e aliado do presidente americano.

Seu comentário foi feito como resposta a uma publicação na rede X indicando um discurso de Alexandre de Moraes, no final de semana, acusando as plataformas digitais de adotar uma “ideologia fascista”.

Paulo Figueiredo, que mora nos EUA, respondeu à postagem, de forma sincronizada com o governo Trump. Ele sugeriu que Moraes sequer precisaria ter ativos nos EUA, já que a inclusão de seu nome na lista de pessoas sob sanção permitiria que bancos nos EUA vetassem qualquer abertura de contas em seu nome.

Instantes depois, e mais uma vez de forma coordenada, Musk respondeu: “Interessante”.

De fato, as sanções contra o ministro brasileiro também foram sugeridas no processo da Rumble e das empresas de mídia de Donald Trump contra Moraes.

Manipulando dados e fatos no documento apresentado às cortes na Flórida, as duas empresas insistem que Moraes repetiu o mesmo comportamento do Tribunal Penal Internacional ao ameaçar os interesses de cidadãos e empresas americanas. A corte internacional foi alvo de sanções e seu procurador-geral teve seus bens confiscados nos EUA.

Para diplomatas e interlocutores em Washington ouvidos pela reportagem, o palco de uma crise política entre Donald Trump e o Brasil está sendo montado.

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