Palmeiras registra receita e superavit recordes em 2021, mas não vive época de extravagâncias

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Leila Pereira tem um problema incomum para lidar em seu início de mandato no Palmeiras. Na posição de patrocinadora, nos últimos anos, a empresária ficou nacionalmente conhecida por injetar centenas de milhões de reais no clube. As vitórias e os títulos chegaram, junto da fama de riqueza alviverde. Só que esses rótulos, hoje, atrapalham a dirigente.

Enquanto a torcida demanda a contratação de um centroavante, a presidente alega que o cargo exige dela responsabilidade financeira.

E aí surge o fato novo. No balanço que acaba de ser publicado, referente a 2021, estão expostos o faturamento de R$ 910 milhões e o superavit de R$ 123 milhões naquele ano – os maiores da história palmeirense.

Quer dizer, então, que Leila nega reforços, enquanto o Palmeiras nada em dinheiro? Na verdade, não. A leitura do balanço requer cuidados para evitar conclusões equivocadas, ainda mais em tempos de pandemia, que bagunçaram momentaneamente a contabilidade do futebol.

A diferença mais importante, para entender a situação, fica entre a demonstração de resultado (receitas, despesas e lucro) e o fluxo de caixa (dinheiro que efetivamente entra e sai da conta bancária).

Ao mesmo tempo em que o Palmeiras teve um superavit de R$ 123 milhões em 2021, o caixa registrou um aumento de apenas R$ 9 milhões. É como se você pudesse olhar o extrato bancário do clube em 31 de dezembro de 2020 e de 2021 e comparar a variação, que foi mínima.

As razões para números tão altos

Quando Dudu foi emprestado ao Al-Duhail, os árabes aceitaram pagar R$ 46 milhões para ter o atacante. No caixa do Palmeiras, o valor entrou todo em 2020. Já no registro das receitas, por questões contábeis, o clube registrou R$ 21 milhões naquele ano e R$ 25 milhões em 2021.

Qual é a consequência prática? Esses milhões contabilizados no balanço mais recente aumentam o faturamento e, consequentemente, elevam o superavit. Mas na conta bancária esse dinheiro já passou faz tempo.

Outra situação tem relação direta com a Crefisa. Nos últimos anos, além de patrocinar o clube, a companhia fez empréstimos a juros muito baixos para contratações de jogadores. Esses recursos precisam ser devolvidos.

Em 2021, o Palmeiras reduziu essa dívida com a patrocinadora em R$ 47 milhões. O pagamento foi feito no decorrer do ano de duas maneiras:

  • Repasse de valores obtidos por meio de transferências de atletas;
  • Acerto de contas entre valores de premiações a pagar pela Crefisa (em vez de premiar o clube por títulos, abater parte da dívida).

Essa quantia é registrada nas receitas, mas ela não impactou o caixa palmeirense. A parte referente às vendas de jogadores foi para a Crefisa, e a parte da premiação só foi abatida, sem que houvesse pagamento.

Ainda existe a questão da pandemia. Por causa da suspensão de campeonatos e da conclusão deles apenas no ano seguinte, receitas referentes a 2020 só foram contabilizadas em 2021.

Esse registro atípico será visto nos balanços de todos os clubes, mas no caso do Palmeiras o impacto é muito maior. Tanto por causa das receitas altas no pay-per-view do Campeonato Brasileiro, quanto por ter disputado e vencido duas Libertadores no mesmo ano fiscal.

Os números são os seguintes:

  • Dos R$ 196 milhões registrados pelo Brasileiro no balanço de 2021, R$ 52 milhões correspondem ao campeonato de 2020;
  • Dos R$ 84 milhões contabilizados em premiações da Libertadores, também no balanço de 2021, R$ 37 milhões se referem a 2020.

    Por mais que despesas também tenham sido adiadas de um ano para o outro, o impacto é maior do lado das receitas. Ou seja: o Palmeiras registrou em apenas um balanço valores referentes a duas temporadas diferentes. E não há nada errado do ponto de vista contábil.

    Esses três itens – empréstimo do Dudu, pagamento de dívida para a Crefisa e receitas de duas temporadas no mesmo ano – são exemplos de como o lucro contábil sozinho pode não contar direito a história.

    É por isso que os resultados são tão discrepantes entre 2020 e 2021. No ano retrasado, o clube registrou um deficit (prejuízo) de R$ 151 milhões. No passado, um superavit (lucro) de R$ 123 milhões. Se não fosse a mudança atípica, forçada pela pandemia, seria muito diferente.

    Em português claro

    É comum que, logo após a publicação do balanço, notícias puxem a história pelo que há de mais relevante, como faturamento, lucro ou prejuízo. Mas é importante entender o contexto, pois em determinadas situações esses números, isolados, podem levar a conclusões erradas.

    Palmeiras não está em crise financeira, diferente de muitos adversários diretos. Mas também não passa por época de bonança. Ainda há impactos do período da pandemia nas contas.

    O orçamento alviverde para 2022 conta com receita de R$ 625 milhões e superavit de R$ 14 milhões. Essa é a projeção para a temporada, com números muito inferiores aos registrados no balanço referente a 2021.

    De acordo com a diretoria do clube, consultada pelo ge, grande parte desse faturamento projetado ainda precisará ser garantido por meio de transferências de atletas e premiações. Em outras palavras, o Palmeiras terá de vender jogadores e ainda se superar em campo, na Copa do Brasil e na Libertadores, para manter as finanças em ordem.

    Leila Pereira lida com a consequência de um histórico atípico. O patrocínio da Crefisa é o maior do futebol brasileiro há vários anos, e essa parceria contribuiu para levar o clube a títulos e glórias. Agora que ela é presidente, ainda mais sendo empresária bem-sucedida, a cobrança por investimentos aumenta. Mas é melhor ter calma ao interpretar números.

    PS.: A análise integral do balanço será publicada pelo ge em breve, como parte da série anual sobre as finanças do futebol brasileiro em 2021.

    GLOBO ESPORTE

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